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Artigos › 20/02/2024

O CANSAÇO NA VIDA SACERDOTAL!

É frequente encontrar sacerdotes que se sentem cansados pelo excesso de trabalho, pelo sufoco na realização de serviços muito exigentes, por estilos de vida pouco saudáveis, bem como pelo excesso de atividades em detrimento de uma espiritualidade empobrecida e, no caso de muitos deles, com características emocionais de personalidade que os impedem de adaptar-se de modo adequado diante das exigências de sua existência. Finalmente, torna-se evidente que os sacerdotes tambem podem ser vítimas do estresse patológico e que muitas vezes chegam a se desgastar no desempenho de sua missão até se esgotarem.

Os primeiros anos de sacerdócio marcam alguns presbíteros de forma permanente, ao depararem com uma realidade muito diferente daquela que viveram no seminário. Alguns experimentam desencanto quando enfrentam situações duras e difíceis, como no caso de uma diocese de fronteira, com problemas econômicos e sociais e inúmeras necessidades. O fato de não poderem estruturar um horário normal frente às transbordantes exigências do povo faz com que surjam os cansaços, os desalentos, a desordem no estilo de vida, ao lhes tirar horas de sono ou fazê-los comer qualquer coisa em qualquer lugar. Desse modo, quando se descuidam os tempos pessoais de oração e meditação, aparecem a frustração e a falta de sentido. Isso, associado à falta de relação com companheiros sacerdotes aos quais confiar as dificuldades, repercute numa espécie de deserto afetivo que propicia os questionamentos que talvez nunca foram colocados durante o tempo de seminário.

Assim emerge aquilo que nunca aconteceu antes e por isso o presbítero acredita estar experimentando uma crise vocacional. Portanto, vale a pena discernir muito bem as crises vocacionais que surgem no contexto desse tipo de condições de vida, sob a luz de Deus e com a ajuda dos superiores ou pessoas idôneas. Porque talvez o problema não seja exatamente vocacional, e sim devido à carga sufocante de uma missão conduzida de forma inadequada – fato que constitui uma sobrecarga do ponto de vista da fragilidade humana da pessoa – e não assumida realmente como Igreja na força de Cristo.

Essa situação é muito dolorosa porque, embora grande número das vocações sacerdotais em nossos países latino-americanos venha de situações nascidas na dor, como é o caso daqueles jovens que sofreram traumas e maus-tratos, não é possível dar-se o luxo de esperar que todos os seminaristas tenham estrutura psíquica ótima. Todavia, quando a vocação é autêntica, o próprio Deus se manifesta e configura neles sua imagem. Daí a importância da formação nos seminários e do acesso, nesses anos, a profissionais fiáveis que possam colaborar para dotar os futuros sacerdotes com as capacidades necessárias para exercer o ministério.

Fato lamentável é que às vezes sacerdotes aprisionados pelo esgotamento desvirtuem o dom que o Senhor Jesus lhes outorgou e, embora tenham verdadeira vocação para o sacerdócio, abandonem equivocadamente o ministério. Isso faz com que após a deserção sacerdotal muitos deles carreguem em sua alma, como escreveu o poeta nicaraguense Rubén Darío, em seu poema Nocturno, “o pesar de não ser aquilo que eu deveria ser, a perda do reino que estava para mim” (Darío, 2007); pois nada nem ninguém pode substituir, em tais casos, a Ordem sacerdotal.

Assim como a síndrome de burnout se dá nas profissões de ajuda e tende a desenvolver-se em pessoas que manifestam entusiasmo e envolvimento pessoal em seu trabalho, os sacerdotes não estão imunes de sofrer esse tipo de transtorno. Portanto, os presbíteros podem ser também considerados como profissionais de ajuda que desempenham, entre outros, um papel de orientação e de assistência a serviço de pessoas em situações de crise e frequentemente em risco social, e por isso eles próprios se esgotam procurando resolver os conflitos e problemas das pessoas que acorrem pedindo sua ajuda.

Apesar disso, diferentemente de outras profissões, o chamado ao sacerdócio pressupõe total entrega a serviço de Deus e da sociedade. Por essa razão, a vocação à vida sacerdotal deve estar associada a uma experiência mística profunda que alente e motive a pessoa a manter-se a serviço de sua missão ao longo da existência, procurando sadio equilíbrio entre as dimensões de sua personalidade sob a ordem divina.

Todavia, nem todos os sacerdotes experimentam essa intensa vivência de fé e, em tempos de crise e de desalento, muitas vezes sucumbem por causa da carência de conhecimento mais profundo de sua própria humanidade ou de uma espiritualidade mais madura que possa sustentá-los.

Hoje se fala da existência de uma crise sacerdotal na Igreja. Nesse sentido, é preciso reiterar que os presbíteros receberam o mesmo chamado à santidade que qualquer outro cristão. Conforme afirma claramente o concílio Vaticano II, toda pessoa é chamada a ser santa “como Deus é santo” (Lv 20,26; Mt 5,48). É assim que os presbíteros foram chamados à santidade, não só pelo batismo, mas também pelo sacramento da Ordem sacerdotal, e isso transforma esse chamado em vocação com características específicas (Cerra, 2005).

Embora na sociedade atual tenham sido produzidas mudanças socioculturais que causam impacto tanto na Igreja quanto nos sacerdotes, e, embora se perceba certo desalento religioso, a exigência das experiências rituais se conserva praticamente igual às de épocas passadas (Uriarte,
2003). Por conseguinte, quando os sacerdotes caem vítimas de ativismo desmedido, rompe-se o equilíbrio entre ação externa e vida interior, sobrevindo o estresse patológico.

Melguizo (2007), ao citar a categorização de sacerdotes no panorama do estresse apresentado pela doutora Jeannine Guindon, assessora no sínodo de 1990 sobre a vida sacerdotal, propõe a existência de três tipos de presbíteros. Primeiro, aqueles que se desgastam em seu ministério com muita generosidade, comprometendo sua saúde e até a própria vida. Segundo, aqueles que realizam suas obrigações medianamente, sem fazer uso adequado de seus talentos. Finalmente, aqueles que assumem sua missão em plenitude, mas sem sacrificar sua saúde física ou psíquica, graças a um adequado conhecimento de si mesmos, a uma sadia autoaceitação e a uma assertiva abertura à mudança e ao crescimento.

Três autores contemporâneos, Lewis, Turton e Francis, baseados em vários estudos sobre a saúde psíquica entre os clérigos, afirmam que há elevado nível de burnout relacionado com as exigências de trabalho nos vários grupos participantes de suas diferentes pesquisas, independentemente da denominação religiosa ou país de origem, pois tais estudos incluíram clérigos anglicanos, sacerdotes católicos, ministros metodistas e pastores pentecostais (2007).

Para ter vida sacerdotal nas melhores condições possíveis, o ideal é dotar os candidatos ao sacerdócio, a partir de sua etapa de seminário e posteriormente durante sua vida sacerdotal, com as ferramentas necessárias para manter bom equilíbrio de vida, mesmo nas situações adversas. Isso requer o desenvolvimento de capacidades de autocuidado espiritual, psicológico e físico, bem como do aprendizado e cultivo da inteligência emocional e de habilidades sociais para o exercício do ministério.
Os presbíteros, sobretudo entre os outros profissionais de ajuda, necessitam maior qualidade de vida somente alcançada mediante melhor autoconhecimento e autocuidado, dentro do contexto de suas realidades sociais e eclesiais.

1 MEZÉRVILLE, Helena López de. O desgaste na vida sacerdotal. Prevenir e superar a síndrome de bornout. Paulus, pp. 71-75.

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